Desde a última vez que nos encontrámos (esta newsletter e o teu tempo de leitura), a vida tem galopado e eu sem fôlego para acompanhar. Depois de uma gravidez mais difícil, com muito cansaço, uma ida às urgências em Guimarães depois do Natal (os meus sogros moram em Fafe), e uma bebé que nasceu a 27 de dezembro de cesariana de emergência. Um filhote que não viu os seus 2 anos celebrados a 28 de dezembro e, em vez disso, passou 10 dias doente, em casa dos avós (4 por estarmos no hospital e os restantes para terminar o antibiótico antes do contacto com a irmã), uma recuperação inesperadamente dolorosa, de quem não contava ser aberta e cosida (pessoas que escolhem cesariana: nunca vou entender – mas o que é aquilo que acontece ali?), uma última semana de trabalho que não aconteceu e que me assombrou todo esse tempo. Um regresso a casa. Respirar fundo. Recuperação lenta. Enjoos. Um mês depois, nova ida às urgências, novamente em Guimarães, e internamento de 5 dias – com bebé incluído para que pudesse amamentar e com sorte não foi mais tempo – para vigilância de pedras na vesícula. E eis que chega o dia de hoje, na sexta semana pós-parto (o fim do período mínimo oficial para recuperação), a alimentar-me em bicos de pés com medo de acordar o cascalho que tenho cá dentro, de o empurrar para canais onde não devia estar e causar novo internamento.
Quando somos pequenos ouvimos os mais velhos a pedir por saúde, mas a saúde parece-nos garantida. Corremos, dobramo-nos para apanhar coisas, acordamos e adormecemos todos os dias a pensar no seguinte e no anterior. Somos pequenos, mas fortes. Só quando chegamos a adultos é que crescemos para nos sentirmos grandes, mas frágeis. A primeira gripe sozinhos em casa, a primeira ida ao hospital sem acompanhante, a primeira vez que passamos uma noite doentes. E depois temos filhos, e podemos estar doentes nós e eles; eles, ingénuos da maravilha que é ser cuidado, sem condição; nós, arrastados pelo chão por termos de cuidar de nós e deles, nem sempre por esta ordem.
Mas esta newsletter também é sobre vida profissional. Onde é que ela cabe aqui?
Trabalhar por conta própria tem muitas vantagens, sabemos. Também tem desvantagens, e em poucas situações são tão evidentes como quando nos sentimos vulneráveis e incapazes de trabalhar: seja pela chegada de um bebé, chega por doença, seja por luto, seja pelo que for, às vezes a vida agarra-nos pelo pescoço e exige que não façamos mais nada senão tentar respirar.
No dia-a-dia gostamos de acelerar – fechar tarefas, check, check, responder às mensagens, instagram, whatsapp, sms, chamadas para devolver, e-mails, leituras em dia, arrumar a casa, planear as refeições, habit stacking é a chave, dizem, uns a seguir aos outros, em pilha, num fluxo circular que se repete segunda, terça, quarta, quinta há pilates, sexta, sábado, domingo há visita à família, e depois somos obrigados a parar – mas mais nada pára.
As tarefas acumulam-se, as mensagens continuam a chegar, as notícias correm, a roupa empilha, a loiça fica por lavar e os gatos continuam a largar pelo, não há energia para pilates à quinta, e o plano de refeições precisa de tempo para ser revisto – o sistema está montado (o segredo não são os sistemas?), mas há uma falha no caminho, uma pedra na engrenagem, e em vez de saírem resultados, o sistema entope. Mais mensagens, mais roupa, mais loiça, mais notícias, mais tarefas.
A produtividade não nos salva. Voltar atrás não é possível. Acelerar não é possível: a espera é a espera, a recuperação é a recuperação. Nessa altura, é inevitável pensar: quando o meu sistema individual falha, quem é que tenho na retaguarda?
Até breve,
Sofia
Para seguir
Mariamélia
Nos últimos 5-7 anos vimos as lojas e projetos de artesanato português aparecerem, primeiro timidamente, depois um pouco por todo o lado online. Nem todos têm o mesmo cuidado e integridade. Um dos que sigo há mais tempo é o Mariamélia, com uma filosofia muito própria, transparente, e que é um dos que continua a fazer braço de ferro com o consumo, assumindo as suas contradições. Estão nos planos: dois candeeiros cá para casa.


Da internet
Guias do Nick Kolenda
Já mencionei o Nick Kolenda antes. A newsletter dele e uma das que leio sempre: muito curta, direta ao assunto, apresenta estratégias de marketing com base em literatura científica – desde preços, cores, a nomes de marcas, há de tudo um pouco no cruzamento entre psicologia e consumo.
Ler/ver/ouvir
Once You Get the Message, Hang Up the Phone. “One of the most insightful things I learned as an evolutionary biologist is the way in which opposing forces co-evolve. How the cheetah and antelope have made each other faster over generations. (…) This dynamic applied to human deception (…) Consider this thought experiment: being able to lie effectively would confer an advantage in many situations, so humans should have evolved to lie very well.”
Corpos espumosos e o confronto com a vulnerabilidade. Um texto forte e sensível, que toca muitos dos pontos da introdução desta edição da newsletter. Para ler, pensar nos outros e no futuro.
Show Me Your Guts. Um texto líquido, que gostei muito de ler, sobre a evolução da tecnologia nos últimos anos. Lembras-te dos iMacs transparentes e coloridos?
Entretanto, no luscofia®
No dia 22 de março vou estar no Women&Wealth 2025! Desta vez o evento regressa ao Porto. Os bilhetes já estão à venda e recomendo muito! Esta é a terceira edição e tenho a sorte de ter sido oradora ou formadora nas outras duas. Foram sempre incríveis, cheias de informação relevante, muito bem organizadas e com muito boa energia – não é exclusivo para mulheres, mas vamos de certeza ser a maioria :)